Boutique M&A Internacional: quando olhar para fora ou focar no mercado doméstico?

O contexto do capital global no Brasil

O mercado brasileiro de fusões e aquisições (M&A) vive um cenário de adaptação e seleção. Conforme reportado pela KPMG América Latina, o ambiente de M&A na região está cheio de oportunidades, mas também de riscos e complexidades regulatórias. KPMG Em particular, no Brasil, a The Rio Times reportou que no primeiro semestre de 2024 houve 426 transações no país, e cerca de 60% delas foram com empresas brasileiras.

A participação internacional existe, mas não há dados públicos amplamente divulgados que validem com precisão ticket médios e valores mínimos para empresas médias. Por isso, empresários devem manter cautela ao estimar o nível de preparo exigido para atrair capital estrangeiro.

Tendências em fusões e aquisições: a resiliência do Brasil em comparação com a América do Norte e a Europa. (Foto: reprodução da internet)
Tendências em fusões e aquisições. Foto: (reprodução da internet)

Quando o mercado doméstico faz mais sentido

1. Faturamento abaixo de R$ 50 milhões/ano
Fundos internacionais geralmente operam com estruturas maiores, e o custo de uma transação internacional (due diligence, compliance, estrutura de captação) pode não compensar para empresas menores.
Dica prática: Consolidar presença regional primeiro, seja líder no Sudeste, Sul ou Nordeste, pode levar a uma saída doméstica mais rápida e lucrativa.

2. Negócios intensivos em relacionamento local
Negócios que dependem de licenças municipais, redes de franquias regionais ou modelos fortemente locais enfrentam maiores desafios para compradores internacionais.
Dica prática: Buscar compradores estratégicos nacionais que compreendem o ambiente cultural e regulatório local tende a gerar transações mais suaves.

3. Governança fora do padrão internacional
Condições como contabilidade desorganizada, contratos informais ou ausência de conselho podem afastar investidores estrangeiros.
Dica prática: Dedicar 12 a 18 meses para construir governança, auditoria independente e compliance elevam a atratividade.

4. Múltiplos domésticos já competitivos
Alguns setores no Brasil operam com múltiplos próximos aos internacionais — isso pode significar que focar no mercado interno é a opção mais eficiente.
Dica prática: Avaliar se o ganho incremental de ser internacional justifica o tempo de preparação e custo.

Quando olhar para fora faz sentido

  • Seu negócio opera num setor de crescimento global (por exemplo, tecnologia, saúde digital ou energia renovável)

  • propriedade intelectual ou tecnologia diferenciada

  • Você busca crescimento acelerado, não apenas uma saída estratégica imediata

  • O ambiente macroeconômico brasileiro está em fase de risco elevado, e diversificação internacional faz sentido

Se essas condições forem atendidas, buscar capital ou comprador internacional pode gerar múltiplos mais elevados e visibilidade global.

Caminho estratégico: preparar-se para ambos

Uma estratégia robusta permite estar pronto tanto para uma transação doméstica quanto para uma internacional. A seguir estão os principais itens que devem estar bem endereçados.

Governança & Estrutura Jurídica

  • Contabilidade auditada

  • Contratos formalizados

  • Compliance tax & labor (fiscal e trabalhista)

  • Conselho consultivo ativo

  • Processos documentados

Financeiro

  • EBITDA estável nos últimos 3 anos

  • Projeções realistas articuladas

  • Capital de giro bem gerenciado

  • Dívida estruturada e transparente

  • KPIs mensuráveis e acompanhados mensalmente

Operacional

  • Time de gestão profissionalizado

  • Sistemas de gestão (ERP/CRM/BI) implantados

  • Diversificação de clientes (nenhum > 50% da receita)

  • Contratos de receita recorrente ou previsível

Comercial & Marca

  • Posicionamento de marca claro

  • Documento de diferenciação competitiva

  • Casos de sucesso comprovados

  • NPS ou métrica similar elevada

  • Presença digital consistente

Checklist adicional para transações internacionais

  • Demonstrações financeiras seguindo as Normas Internacionais de Relatórios Financeiros (IFRS)

  • Pitch deck em inglês

  • Estrutura societária limpa

  • Propriedade intelectual registrada

  • Time fluente em inglês

  • Participação em eventos ou associações internacionais

Como o capital global realmente se comporta

  • Investidores estrangeiros buscam equivalentes regionais de modelos já validados, novidade pura raramente é aceita sem histórico.

  • Comunicação em inglês é um fator crítico; muitos processos cruzados fracassam por falha de fluência.

  • Uma estrutura legal limpa é obrigatória; passivos trabalhistas ou ambientais são “deal kill”.

  • Processos internacionais levam mais tempo, 180 a 360 dias não são incomuns, exigindo liquidez e paciência.

  • Apesar de potencial para múltiplos maiores, exigências operacionais e contratuais tendem a ser mais rigorosas.

Conclusão

Para empresas médias, não existe resposta universal. O momento de buscar capital internacional depende de diversos fatores, entre eles o faturamento, setor, governança e maturidade da empresa. Enquanto negócios com faturamento acima de R$ 100 milhões, EBITDA elevado e governança estruturada podem explorar o mercado internacional, empresas em fase de estruturação ou consolidação tendem a ter maior retorno focando no mercado doméstico.

A pior decisão é a indecisão. Avaliar sem agir ou se preparar mal, pode levar à estagnação.

O IGHER atua no posicionamento estratégico de empresas médias, tanto para transações domésticas quanto internacionais. Consulte nossos especialistas para definir qual estratégia de M&A cabe no estágio da sua empresa.

Valuation em tempos de juros altos: estratégias para não perder valor

Por que o cenário mudou

Nos últimos dois anos, o ambiente global de juros elevados tem pressionado o mercado de fusões e aquisições (M&A) de forma significativa. Dados recentes da PwC mostram que os múltiplos médios de transação caíram de 14,3× para 10,8× EBITDA, refletindo o aumento do custo de capital, a maior aversão a risco e a exigência de retorno mais alto pelos investidores.

Em outras palavras, o mesmo negócio que há alguns anos era avaliado em 100 milhões hoje pode valer entre 25% e 30% menos, mesmo com resultados operacionais estáveis. Essa mudança exige um olhar técnico e adaptativo dos empresários e consultores envolvidos em valuation em tempos de juros altos. O desafio agora é claro: preservar valor em um mercado mais seletivo, sem depender apenas de múltiplos históricos.

Análise de valuation e governança financeira
Análise de valuation e governança financeira

Ajuste o modelo ao novo custo de capital

Em um cenário de juros elevados, o WACC (Weighted Average Cost of Capital) se torna o principal fator de compressão nas avaliações. Empresas que continuam aplicando taxas defasadas acabam inflando seus valuations e perdendo credibilidade nas negociações.

A recomendação é revisar taxas livres de risco atualizadas (como Selic ou Treasuries), prêmios de risco de mercado e setoriais, além do custo de dívida real considerando spreads bancários e risco-país.
Como mostra o Banco Central do Brasil, a taxa Selic tem permanecido em patamares historicamente altos, o que impacta diretamente o custo de capital e o apetite por risco. O valuation precisa refletir o mundo como ele é, não como gostaríamos que fosse.

Reforce a previsibilidade do fluxo de caixa

Em contextos de incerteza, investidores pagam mais por segurança e recorrência do que por promessas de crescimento acelerado. Empresas com contratos contínuos, carteira de clientes diversificada e margens estáveis resistem melhor à compressão de múltiplos.

Por isso, é fundamental reduzir a dependência de poucos clientes, garantir previsibilidade de receita e aprimorar a governança financeira. O artigo A importância da governança financeira no M&A mostra como práticas sólidas de controle e transparência aumentam a confiança do investidor e sustentam o valuation.

Negócios previsíveis preservam valor mesmo quando o mercado se retrai.

Valorize seus intangíveis com método

Em períodos de juros altos, ativos intangíveis como marca, base de dados, tecnologia, contratos e know-how ganham papel central na defesa de valor. No entanto, muitas empresas médias ainda subestimam esses ativos ou os apresentam de forma pouco mensurável.

A recomendação é documentar e mensurar base de clientes, propriedade intelectual, sistemas próprios e estrutura de processos. A cultura organizacional, quando bem estruturada, também pode agregar valor ao valuation, especialmente em empresas com histórico de retenção de talentos e inovação.

Um intangível sem lastro documental é apenas uma boa narrativa. Com documentação e métricas claras, torna-se um ativo estratégico.

Revise os múltiplos de referência

Os múltiplos de EBITDA ou receita devem ser analisados com cautela, especialmente em 2025. Com a queda média global para 10,8× EBITDA, é essencial entender que cada setor reage de forma diferente.

Empresas de tecnologia e SaaS ainda operam acima de 12×, enquanto serviços e saúde mantêm estabilidade entre 8× e 10×. Já a indústria e o varejo enfrentam compressão mais acentuada. Em vez de se apoiar em médias de mercado, é mais prudente utilizar múltiplos ajustados à realidade do seu segmento e país.

Essa abordagem técnica evita a superavaliação e prepara o negócio para uma negociação mais realista.

Prepare-se para negociações mais técnicas

O ambiente atual privilegia quem chega preparado. Empresas que dominam seus números, entendem seu valuation e apresentam relatórios de governança sólidos conseguem defender valor mesmo em mercados retraídos.

Por outro lado, negócios desorganizados ou dependentes de narrativas subjetivas tendem a ceder mais em preço. Transparência, dados auditáveis e coerência estratégica são o novo poder de barganha no M&A.

Conclusão

O ciclo de juros altos não é uma barreira intransponível, mas uma nova régua de qualidade. Empresas que revisam suas premissas, fortalecem a previsibilidade e documentam valor de forma técnica não apenas preservam seu valuation em tempos de juros altos, mas saem à frente quando o mercado retoma.

Em M&A, a preparação continua sendo o melhor antídoto contra a volatilidade.